segunda-feira, 9 de abril de 2012

SUCESSÃO 19 - PETIÇÃO DE HERANÇA

SUCESSÃO 19: PETIÇÃO DE HERANÇA[i]
DICAS DE DIREITO - Professor Jorge Ferreira da Silva Filho* - Blog Ensino Democrático http://jorgeferreirablog.blogspot.com.br/2012/04/sucessao-19-peticao-de-heranca.html
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1.      LOCALIZAÇÃO DO TEMA. Inovando, em relação ao CC/16, o CC/2002 inaugurou um capítulo denominado “Petição de herança” (Cf. nota “i”).  O tema surge heterotópico, eis que a matéria regulamentada tem majoritariamente natureza processual. Parece-me que a maior dificuldade cognitiva apresentada pelos alunos em relação ao tema reside na falta de correlacioná-lo com o procedimento especial de inventário e partilha, que na maioria das grades curriculares ainda não foi ministrado. Por isso, didaticamente, em breves linhas, será abordado inicialmente os conhecimentos necessários sobre o procedimento de inventário e partilha. Recomendo ler: http://jorgeferreirablog.blogspot.com.br/2010/10/p490-inventario-e-partilha.html
2.      O PROCEDIMENTO DE INVENTÁRIO E PARTILHA. Com a morte, abre-se a sucessão. Inicia-se também a contagem do prazo de 60 dias para o oferecimento da ação de inventário [abertura do inventário]. Recebida a petição de inventário, o juiz nomeia o inventariante. Este, depois de assumir o compromisso, tem o prazo de vinte dias para apresentar as primeiras declarações, peça processual que obrigatoriamente relaciona todos os herdeiros. Apresentadas as primeiras declarações, o juiz ordena a citação dos herdeiros. Concluídas as citações, abre-se o prazo de 10 dias para quem se julgar prejudicado, arguir omissões nas primeiras declarações e contestar a qualidade de quem foi incluído indevidamente como herdeiro.[ii]  Este é o momento processual adequado[iii] para alguém que é o verdadeiro herdeiro na ordem da vocação hereditária requerer sua inclusão e afastar os aparentes herdeiros. É também a oportunidade adequada para alguém pleitear sua inclusão como mais um herdeiro de sua classe. Pode ser, porém, que tais pessoas somente descubram que foram omitidas ou preteridas na sucessão, quando o processo já atingiu sua  fase final ou  depois que o processo de inventário estiver finalizado. Neste caso, o procedimento para demandar pelos direitos do preterido na herança ou afastar o herdeiro aparente, é o processo cognitivo denominado petição de herança. [iv]
3.      A FINALIDADE DA PETIÇÃO DE HERANÇA. Como explicado acima, a ação de petição de herança somente terá cabimento depois que for julgado por sentença a partilha requerida na ação de inventário e partilha ou quando no procedimento de inventário de partilha já se encontrar ultrapassada a fase de impugnação. Na primeira hipótese, pressupõe-se que, julgada a partilha, a herança deixada esteja na posse de herdeiros aparentes, falsos herdeiros ou, simplesmente, possuidores a qualquer título. Na segunda, a posse da herança poderá também restar em mãos de quem não tem efetivamente  este direito. A finalidade da petição da herança cinge-se, pois, em dois objetos: pedir a declaração da qualidade do autor da ação como herdeiro; obter [reivindicar] a restituição da herança ou de parte dela. [v]
4.        PRAZO PRESCRICIONAL. O objeto da ação de petição de herança é duplo. Um de natureza declaratória; o segundo de natureza condenatória à restituição da herança. Há, portanto, uma pretensão,[vi] a desafiar a prescrição. Por inexistir prazo específico para a pretensão em tela,[vii] o prazo prescricional é o geral, ou seja, 10 anos.[viii] O prazo é contado da abertura da sucessão, salvo para o incapaz, que tem a prerrogativa de iniciar a contagem do prazo quando cessar sua incapacidade.[ix] Recomendo aos alunos revisitar os conceitos de prescrição em: http://jorgeferreirablog.blogspot.com.br/2012/04/exame-de-ordem-100-topicos-de-direito.html
5.      DA LEGITIMIDADE PASSIVA. A ação de petição de herança é oferecida em face [contra] quem for o detentor da herança, no momento que a ação é proposta. Não interessa se o detentor é o não herdeiro.[x] Quem tiver o efetivo poder sobre a herança, ou parte dela, será o requerido [réu] nesta ação. Se o inventário ainda se encontrar em curso, a ação de petição de herança não pode ser movida contra o inventariante,[xi] mas, sim, contra os herdeiros, pois a estes se transmitiu a herança no momento da abertura da sucessão. [xii]
6.      DA LEGITIMIDADE ATIVA. O legitimado é o herdeiro que foi preterido ou não incluído no rol dos sucessores. Não importa se é herdeiro legítimo ou testamentário. Sendo herdeiro, ele está legitimado. O substituto do herdeiro testamentário ou o fideicomissário também estão legitimados. Há posturas no sentido de que a Fazenda Pública goza de legitimidade para afastar o herdeiro aparente, deflagrando-se, assim, o procedimento referente à herança jacente.
7.      A INEXIGIBILIDADE DO LITISCONSÓRCIO ATIVO. A ação de petição de herança pode ser movida apenas por um dos herdeiros. Ele pode requerer validamente a totalidade da herança. Se procedente o pedido na ação retro, todos os herdeiros serão beneficiados. [xiii]
8.      O PAGAMENTO INDEVIDO DE LEGADO POR HERDEIRO APARENTE.[xiv] Inovando, o legislador regulamentou as consequências jurídicas para o herdeiro aparente[xv] que, estando de boa-fé,  pagar um legado indevidamente. A redação do artigo não é clara,[xvi] pois pressupõe que o legatário também seja aparente. A figura do legatário aparente surge quando o testamento é nulo, a disposição testamentária sobre o legado é nula, o testamento é anulável ou fora revogado. [xvii] Herdeiro aparente que paga a legatário aparente um legado não está obrigado a ressarcir, desde que tenha agido com boa-fé. Uma aplicação da teoria da aparência.
9.      COMPARAÇÃO ENTRE A AÇÃO REIVINDICATÓRIA DE HERANÇA E PETIÇÃO DE HERANÇA. Ambas as ações são reais. A causa de pedir é a mesma, ou seja, alguém se declara herdeiro e reclama a posse de bem da herança que está indevidamente com o réu. A diferença reside no fato de que na petição da herança se pede uma universalidade e na ação reivindicatória se pede coisa determinada. [xviii]
10.  EFEITOS JURÍDICOS PARA O POSSUIDOR DA HERANÇA.[xix] Não importa se o possuidor da herança está ou não de boa-fé. A posse deve ser restituída aos verdadeiros ou a todos os herdeiros. Não é somente a posse que deve ser restituída, mas tudo que se obteve da posse. No tocante aos frutos pendentes ou percebidos, relacionados com a posse, aplicam-se as regras de direito das coisas (possuidor de boa-fé ou de má-fé). Depois de o possuidor ter sido citado na ação de petição de herança, a má-fé se presumirá e a mora estará configurada. [xx]
11.  INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE E PETIÇÃO DE HERANÇA. Se alguém é herdeiro de fato, mas não detém o título jurídico para tal, deve buscar primeiro a declaração judicial de sua paternidade ou maternidade. Nos termos da Súmula 149 do STF, a ação de investigação de paternidade é imprescritível, porém, a ação de petição de herança não o é. A pretensão patrimonial está sujeita à prescrição que pode, inclusive, ser declarada de ofício (CPC 219, 5º).

* Professor de Direito Processual Civil e Direito do Consumidor da Faculdade Pitágoras. Mestre em Direito Público pela Universidade Gama Filho.  Especialista em Direito Processual pela Escola Superior de Advocacia da OAB-MG.  Integrante do IAMG – Instituto dos Advogados de Minas Gerais. Associado ao IBRADT – Instituto Brasileiro de Direito Tributário. Coordenador Subseccional da ESA – Escola Superior de Advocacia – OAB/MG -2010. Professor de Direito Tributário e Direito Processual Civil no Centro Universitário do Leste Mineiro – Unileste – 2005 a 2010.



[i] Disposições legais pertinentes ao tema. Código Civil, Artigos 1824 a 1828.
[ii] CPC 1000, I e III, c/c p.u.
[iii] Diz-se que o herdeiro que não foi incluído nas primeiras declarações promoverá sua HABILITAÇÃO (Cf. DIAS, Maria Berenice. Manual de direito de famílias. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 620).
[iv] O inciso III do art. 1.030 do CPC, determina que a partilha julgada por sentença é rescindível “se preteriu herdeiro ou incluiu quem não o seja”.
[v] CC 1824. Ensina EDUARDO DE OLIVEIRA LEITE que “É da natureza da petição de herança, como resulta do texto e do espírito da lei, o duplo fim a que ela visa: por um lado, o reconhecimento judicial da qualidade de herdeiro que o autor arroga...; por outro, a integração dos bens que o demando possui no ativo da herança ou da fração hereditária pertencente ao herdeiro e, temporariamente, em poder de outrem”. LEITE, Eduardo de Oliveira. Comentários so novo código civil: direito das sucessões. Volume XXI, 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 195. No mesmo sentido: DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 619.
[vi] CC 189.
[vii] Não se subsume às hipóteses elencadas no artigo 206 do CC.
[viii] PONTES DE MIRANDA, apud: LEITE, Eduardo de Oliveira. Comentários so novo código civil: direito das sucessões. Volume XXI, 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 196, Nota 310.
[ix] Comentários ao Código Civil: artigo por artigo. Coordenadores Carlos Eduardo Nicoletti Camill ..[et al]. -São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 1304.
[x] A demanda pode ser proposta contra quem comprou (adquiriu) a coisa integrada à herança. Os herdeiros aparentes também se postam com legitimados passivos.
[xi] DIAS, Maria Berenice. Manual de direito de famílias. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 622.
[xii] CC 1784.
[xiii] CC 1825.  Cf. também Comentários ao Código Civil: artigo por artigo. Coordenadores Carlos Eduardo Nicoletti Camill ..[et al]. -São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 1304.
[xiv] Regulamentado no art. 1828 do CC.
[xv] Suponha que uma pessoa morra sem deixar descentes vivos, mas deixando  ascendentes. Estes serão os herdeiros. Decorrido um ano se descobre que o autor da herança teve um filho. Isso torna os ascendentes herdeiros aparentes. Pura teoria da aparência.
[xvi] CC  “Art. 1828. O herdeiro aparente, que de boa-fé houver pago um legado, não está obrigado a prestar o equivalente ao verdadeiro sucessor, ressalvado a este o direito de proceder contra quem o recebeu”.
[xvii] Cf. Comentários ao Código Civil: artigo por artigo. Coordenadores Carlos Eduardo Nicoletti Camill ..[et al]. -São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 1306. MARIA BERENICE DIAS assim exemplifica: Se o herdeiro aparente A entregar ao legatário B o bem determinado pelo testador e, posteriormente, o testamento vier a ser anulado, o legado perde sua existência. O herdeiro aparente não estará obrigado a restituir o valo do legado ao verdadeiro sucessor (herdeiro), mas este poderá mover ação de petição de herança contra B. (. Manual das sucessões. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 624).
[xviii] DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 624.
[xix] CC 1826.
[xx] CC 1826. Parágrafo único.

2 comentários:

  1. Gostei muito de seu blog professor. Muito bem escrito, empregando escorreitamente o venáculo, e com uma clareza ímpar. Obrigado. Rovilson Carvalho. Advogado em Pouso Alegre - MG.

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  2. Excelente artigo professor. Foi muito útil.

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